Recentemente, em fevereiro de 2021, a Sociedade Brasileira de Cardiologia divulgou um Posicionamento sobre o Consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular. Considerando que a última publicação sobre a temática foi a Diretriz de 2013 (link), essa foi uma produção revelante para a área!
Sabemos que a nutrição exerce um papel essencial na gênese, prevenção e tratamento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como as cardiovasculares. Por décadas, diversos artigos, diretrizes e posicionamentos foram publicados sobre o papel do consumo alimentar na saúde cardíaca e cardiovascular, principalmente em relação aos alimentos fontes de gorduras.
No entanto, muitos resultados divergentes entram constantemente em discussão. Esses conflitos podem ser compreendidos pela imprecisão metodológica em muitos estudos, além da impossibilidade de comparação entre os mesmos quando há disparidade no tamanho da amostra, população ou nutriente estudado, por exemplo.
Também é necessário reconhecermos que, muitos sites e blogs fazem uso e divulgam dados de forma não correspondente à publicação científica realizada, gerando confusão na população, ou até mesmo entre nós.
As primeiras orientações dietéticas publicadas sobre o tema são dos anos 50, e desde então muita coisa mudou. O que há de evidência nessa temática atualmente? Destacamos alguns pontos:
Impacto no perfil lipídico
- Gordura trans e saturadas exercem maior potencial para aumentar os níveis plasmáticos de colesterol total (CT) e LDL-c. Já a concentração de triglicerídeos (TG) pode ser aumentada por um maior consumo de carboidratos refinados;
- Diferentemente de anos atrás, não há mais uma recomendação de ingestão máxima por dia de colesterol alimentar. No entanto, permanece orientado que mantenha-se o menor possível. Pois, mesmo não exercendo papel primordial no colesterol sérico, ainda causa impacto em indivíduos hiper-responsivos.
- Ácidos graxos saturados, principalmente o palmítico, apresentam capacidade de ativar resposta inflamatória e de estresse oxidativo, prejudicando a integridade do endotélio vascular e potencialmente contribuindo para a gênese da aterosclerose; além de prejudicar a funcionalidade de receptores de insulina;
- O contexto alimentar exerce maior impacto do que o consumo de alimentos isoladamente. Ou seja, mesmo sendo alimentos ricos em ácidos graxos saturados, e sabendo dos efeitos que esses causam quando consumidos em excesso, eles podem exercer um menor impacto na saúde quando estão inseridos em um contexto saudável – com adequação calórica, inclusão de grãos, frutas, hortaliças e redução do consumo de açúcar, alimentos ultraprocessados, gorduras saturadas e trans.
Óleos e gorduras
- Além do óleo de oliva, pode ser orientado o uso do óleo de canola ou soja para o preparo das refeições, esses possuem menor teor de ácidos graxos saturados e maior quantidade de ácido alfa-linolênico (ALA) em sua composição, em comparação com outros óleos vegetais;
- Não há indicação para a substituição de óleos vegetais, como de canola ou oliva, por óleos de coco ou palma, os quais devem ser consumidos apenas de forma ocasional, devido o alto teor de gordura saturada.
Microbiota intestinal
- Dietas hiperlipídicas, especialmente ricas em ácidos graxos saturados, são capazes de alterar a composição da microbiota intestinal, induzir a redução de diversidade bacteriana e aumentar a permeabilidade intestinal; favorecendo a disbiose e até mesmo inflamação sistêmica de baixo grau. O padrão alimentar é muito importante na modulação intestinal, destacando a importância de um consumo alimentar rico em fibras.
Ácidos graxos ômega 3
- A relação de consumo entre ácidos graxos poli-insaturados ômega 6 e ômega 3 deveria ser menor do que é atualmente na população ocidental. No entanto, a orientação para consumo ainda deve ser realizada baseada na porcentagem de consumo de cada gordura, e não estritamente na relação entre os mesmos;
- Há potencial anti-inflamatório derivado de um consumo alimentar rico em ácidos graxos ômega 3. Entretanto, mesmo com os possíveis benefícios, não há evidência suficiente para recomendação de suplementação em muitas condições clínicas;
- O óleo de krill é uma ótima fonte de ácido graxo eicosapentaenoico (EPA) e docosahexaenoico (DHA), apresentando maior biodisponibilidade do que o ômega 3 marinho por ter a maior parte de seus ácidos graxos na forma de fosfolípides.
Esse posicionamento trouxe atualizações sobre a temática, mas também um lembrete importante: “devemos priorizar a avaliação de padrões alimentares, propondo orientações e melhorias também qualitativas, não valorizando alimentos individualmente ou os classificando como proibidos”.
Toda orientação ou intervenção nutricional deve capacitar o indivíduo com conhecimento necessário sobre os alimentos para que ele mesmo possa realizar escolhas alimentares mais saudáveis!
Para acesso ao posicionamento na íntegra acesse esse link!
Boa leitura, até mais!