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Cuidado Nutricional: Alergias Alimentares (Parte II)

Dando continuidade ao texto anterior, vamos abordar o tratamento nutricional nos principais casos de alergias alimentares. As orientações aqui apresentadas são baseadas no recente posicionamento sobre alergias alimentares, publicado pela Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), em conjunto com a Sociedade Brasileira de Pediatria.

Embora o diagnóstico da alergia alimentar seja atribuição médica, o nutricionista desempenha um papel essencial na educação alimentar, auxiliando na prevenção de reações alérgicas e na redução do risco de distúrbios nutricionais, por meio da prescrição de substituições seguras e adequadas.

A condução dietética em casos de alergia alimentar deve ser baseada em:

  • A exclusão completa dos alimentos responsáveis pela reação alérgica, bem como de seus derivados;
  • A inclusão de alimentos substitutos nutricionalmente adequados e seguros, sem risco de contaminação;
  • O apoio no manejo de reações agudas, com ajustes na alimentação e avaliação de possíveis reatividades cruzadas.

Importante acrescentar que a educação nutricional nesses casos também envolve esclarecimentos sobre higiene ambiental e doméstica, reforçando a importância dos cuidados com manipulação de alimentos. Em casos mais graves a reação alérgica pode acontecer até por contato com a pele, ou inalação do alérgeno.

A exclusão do alimento alergênico é a base do tratamento dietético, mas, em determinadas situações, é possível considerar a flexibilidade da dieta. Para isso, é fundamental:

  • Ter a autorização médica para flexibilizar a dieta, além de considerar a fase do tratamento;
  • Avaliar o nível de reatividade e a gravidade dos sintomas, para considerar testar a tolerância alimentar;
  • Verificar a resposta ao consumo de preparos ou produtos com traços do alimento alergênico;
  • Averiguar se há menor reatividade em preparações que passaram por processamento térmico, como alimentos cozidos ou assados.

Existem diversas manifestações clínicas das alergias alimentares, como abordado no texto anterior. Além dos principais alimentos alergênicos, a literatura já identifica os principais componentes responsáveis pelas reações adversas. Confira a imagem abaixo!

Fonte da imagem: http://dx.doi.org/10.5935/2526-5393.20250003

Essa descoberta é muito importante para as condutas nutricionais e para um planejamento alimentar mais seguro. Há pessoas com alergia à soja que também apresentam reações a outras leguminosas, por exemplo. Dessa forma, em casos com sintomas persistentes, uma alternativa possível é restringir outros alimentos com potencial de reatividade cruzada.

Condutas dietéticas para restrições alimentares em cada cenário:

Gestantes: diretrizes anteriores recomendavam que grávidas e lactantes evitassem o consumo de determinados alimentos para prevenir o desenvolvimento de alergias nos bebês. No entanto, uma metanálise realizada no Reino Unido em 2018, que reuniu cinco ensaios clínicos, concluiu que não há evidências de que a exclusão de alérgenos alimentares durante a gestação esteja associada à redução de alergias alimentares nos filhos.

Lactantes: a dieta de eliminação deve ser recomendada para a mãe que oferece aleitamento materno apenas quando o lactente manifestar reações com alérgenos veiculados pelo leite materno.Se os sintomas forem desencadeados após ingestão do alimento via oral, pela criança, a exclusão do alimento da dieta materna não é recomendada. No entanto, quando houver a exclusão de leite de vaca e derivados da dieta materna é preciso realizar a suplementação da nutriz com cálcio e vitamina D.

Alimentação complementar: décadas atrás acreditava-se que retardar a introdução de alimentos potencialmente alergênicos era uma forma eficaz de prevenção. Contudo, como a prevalência de alergias alimentares continuou a aumentar, especialistas passaram a reavaliar essas diretrizes. Atualmente, recomenda-se que todos os bebês, independentemente do risco, sejam expostos a todos os grupos alimentares até os doze meses de vida.

A EAACI (European Academy of Allergy and Clinical Immunology) publicou recomendações específicas para a introdução de ovo e amendoim em populações com alta prevalência de alergia a esses alimentos. Para o amendoim, a sugestão é o consumo de 2g de proteína do alimento uma ou mais vezes por semana. Já para o ovo, recomenda-se iniciar com meia unidade de ovo cozido (cozido por 10 a 15 minutos), duas vezes por semana. A introdução do ovo deve preceder a do amendoim, uma vez que a sensibilização ao ovo tende a ocorrer antes.

Fonte da imagem: http://dx.doi.org/10.5935/2526-5393.20250003

Outras considerações:

  • Não há recomendação para testagem de IgE específica para alimentos como conduta de rotina na introdução alimentar;
  • A introdução alimentar deve respeitar os hábitos da família, permitindo que a criança tenha contato com todos os grupos alimentares entre os seis e doze meses de vida;
  • Na impossibilidade do aleitamento materno exclusivo, não há recomendação favorável nem contrária ao uso de fórmula infantil à base de leite de vaca após a primeira semana de vida, com o intuito de prevenir alergias;
  • Revisões de estudos demonstraram que a introdução de fórmulas à base de leite de vaca após a primeira semana de vida não teve impacto consistente na prevenção de alergia à proteína do leite de vaca na infância.

Restrições alimentares desnecessárias, especialmente na infância, estão associadas a prejuízos sociais e psicológicos. Por isso, é fundamental que o diagnóstico médico seja assertivo e que a orientação nutricional seja igualmente bem conduzida.

Muitos pais evitam oferecer alimentos conhecidos por seu potencial alergênico (como ovo, leite, castanhas, entre outros) por medo do desenvolvimento de alergias em seus filhos. No entanto, além de gerar restrições desnecessárias, essa prática reduz a exposição alimentar da criança.

Apesar de parecer contraditório, a menor exposição a um alérgeno não oferece proteção. Um estudo muito relevante demonstrou que o aumento da diversidade alimentar no primeiro ano de vida reduz as chances de desenvolvimento de alergias.

Os resultados dessa pesquisa indicaram que, para cada alimento alergênico adicional consumido entre os seis e doze meses, houve uma redução de 33,2% na probabilidade de desenvolvimento de alergias alimentares nos primeiros 10 anos de vida. Confira o estudo: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32004745/

Por fim, o documento em questão também apresenta diversas informações sobre introdução alimentar, alimentação escolar e alergia à proteína do leite de vaca (APLV). Além da abordagem teórica, há várias orientações práticas.

Recomendamos que os nutricionistas que atuam com essas demandas se aprofundem na leitura! Confira o material completo: https://asbairj.org.br/atualizacao-em-alergia-alimentar-2025-asbai-e-sbp/

O que acharam do nosso resumo? Até a próxima!

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